Eu sou o bom pastor. Conheço as minhas ovelhas, isto é,
eu as amo, e minhas ovelhas me conhecem (Jo 10,14). É como se quisesse
dizer francamente: elas correspondem ao amor daquele que as ama. Quem
não ama a verdade, é porque ainda não conhece perfeitamente.
Depois de terdes ouvido, irmãos caríssimos, qual é o
perigo que corremos, considerai também, por estas palavras do Senhor, o
perigo que vós também correis. Vede se sois suas ovelhas, vede se o
conheceis, vede se conheceis a luz da verdade. Se o conheceis, quero
dizer, não só pela fé, mas também pelo amor, se o conheceis não só pelo
que credes, mas também pelas obras. O mesmo evangelista João, de quem
são estas palavras, afirma ainda: Quem diz:
“Eu conheço Deus”, mas não guarda os seus mandamentos, é mentiroso (1Jo 2,4).
Por isso, nesta passagem do evangelho, o Senhor acrescenta imediatamente:
Assim como o Pai me conhece, eu também conheço o Pai e dou minha vida por minhas ovelhas
(Jo 10,15). Como se dissesse explicitamente: a prova de que eu conheço
o Pai e sou por ele conhecido, é que dou minha vida por minhas ovelhas;
por outras palavras, este amor que me leva a morrer por minhas
ovelhas, mostra o quanto eu amo o Pai.
Continuando a falar de suas ovelhas, diz ainda:
Minhas ovelhas escutam a minha voz, eu as conheço e elas me seguem. Eu lhes dou a vida eterna (Jo 10,27-28). É a respeito delas que fala um pouco acima: Quem entrar por mim, será salvo; entrará e sairá e encontrará pastagem
(Jo 10,9). Entrará, efetivamente, abrindo-se à fé; sairá passando da
fé à visão e à contemplação, e encontrará pastagem no banquete eterno.
Suas ovelhas encontram pastagem, pois todo aquele que o
segue na simplicidade de coração é nutrido por pastagens sempre verdes.
Quais são afinal as pastagens dessas ovelhas, senão as profundas
alegrias de um paraíso sempre verdejante? Sim, o alimento dos eleitos é
o rosto de Deus, sempre presente. Ao contemplá-lo sem cessar, a alma
sacia-se eternamente com o alimento da vida.
Procuremos, portanto, irmãos caríssimos, alcançar essas
pastagens, onde nos alegraremos na companhia dos cidadãos do céu. Que a
própria alegria dos bem-aventurados nos estimule. Corações ao alto,
meus irmãos! Que a nossa fé se afervore nas verdades em que
acreditamos; inflame-se o nosso desejo pelas coisas do céu. Amar assim
já é pôr-se a caminho.
Nenhuma contrariedade nos afaste da alegria desta
solenidade interior. Se alguém, com efeito, pretende chegar a um
determinado lugar, não há obstáculo algum no caminho que o faça
desistir de chegar aonde deseja.
Nenhuma prosperidade sedutora nos iluda. Insensato seria
o viajante que, contemplando a beleza da paisagem, se esquece de
continuar sua viagem até o fim.
-- Das Homilias sobre os Evangelhos, de São Gregório Magno, papa (século VI)
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