15 de mai. de 2021

A Reconciliação vem de Deus

 Deus é fiel ao seu desígnio eterno mesmo quando o homem, induzido pelo Maligno (Sab 2,4) e arrastado pelo seu orgulho, abusa da liberdade que lhe foi dada para amar e procurar generosamente o bem, recusando a obediência ao seu Senhor e Pai; mesmo quando o homem, em vez de responder com amor ao amor de Deus, se opõe a Ele como a um seu rival, iludindo-se e presumindo das suas forças, com a consequente ruptura das relações com Aquele que o criou. Não obstante esta prevaricação do homem, Deus permanece fiel no amor. A narração do Jardim do Édem leva-nos, certamente, a meditar sobre as consequências funestas da rejeição do Pai, que se traduz na desordem interna do homem e na ruptura da harmonia entre o homem e a mulher e entre irmão e irmão (Gn 3,2). Também é significativa a parábola evangélica dos dois filhos que se afastam do pai, de maneira diversa, cavando um abismo entre si. A recusa do amor de Deus e dos seus dons de amor está sempre na raiz das divisões da humanidade (Lc 15,11-32, Parábola do Filho Pródigo).

 A Volta do Filho Pródigo, Rembrandt

Mas nós sabemos que Deus, rico em misericórdia (Ef 2,4) tal como o pai da parábola, não fecha o coração a nenhum dos seus filhos. Espera-os, procura-os, vai alcançá-los precisamente no ponto em que a recusa da comunhão os aprisiona no isolamento e na divisão e chama-os a reunirem-se à volta da sua mesa, na alegria da festa do perdão e da reconciliação.

Esta iniciativa de Deus concretiza-se e manifesta-se no ato redentor de Cristo, que se irradia no mundo mediante o ministério da Igreja.

De acordo com a nossa fé, de fato, o Verbo de Deus fez-se carne e veio habitar a terra dos homens, entrou na história do mundo, assumindo-a e recapitulando-a em si (Ef 1,10). Ele revelou-nos que Deus é amor e deu-nos o mandamento novo (Jo 13,34) do amor, comunicando-nos, ao mesmo tempo, a certeza de que o caminho do amor está aberto a todos os homens, de tal modo que não é vão o esforço para instaurar a fraternidade universal (Gaudium et Spes, 38). Vencendo, com a sua morte na Cruz, o mal e a força do pecado, pela sua obediência cheia de amor trouxe a salvação a todos e tornou-se para todos reconciliação. N'Ele, Deus reconciliou o homem consigo.

A Igreja, continuando o anúncio de reconciliação que Cristo apregoou nas aldeias da Galileia e de toda a Palestina (Mc 1,15), não cessa de convidar a humanidade inteira a converter-se e a acreditar na Boa Nova; ela fala em nome de Cristo, fazendo seu o apelo do Apóstolo Paulo, que já recordámos: "Nós somos ... embaixadores ao serviço de Cristo, como se Deus exortasse por nosso intermédio. Suplicamo-vos, pois, em nome de Cristo: Reconciliai-vos com Deus" (2Cor 5,20). 

Quem aceita este apelo entra na reconciliação e faz a experiência da verdade contida naquele outro anúncio de São Paulo, segundo o qual Cristo "é a nossa paz, ele que fez de dois povos um só, destruindo o muro de separação, isto é, de inimizade que constituía a barreira (...) estabelecendo a paz para reconciliar uns e outros com Deus" (Ef 2,14-16). Embora este texto diga diretamente respeito à superação da divisão religiosa entre Israel, como povo eleito do Antigo Testamento, e os outros povos, todos chamados a fazer parte da Nova Aliança, ele contém, todavia, a afirmação da nova universalidade espiritual, querida por Deus e por Ele realizada, mediante o sacrifício do seu Filho, o Verbo feito homem, sem limites nem exclusões de qualquer género, para todos aqueles que se convertem e acreditam em Cristo. Todos, portanto, somos chamados a usufruir dos frutos desta reconciliação querida por Deus: todos e cada um dos homens, todos e cada um dos povos.

--  São João Paulo II, Recconciliatio et Paenitentia (seção 10),  2 de Dezembro de 1984.

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