30 de jul. de 2015

A Peregrinação de Santo Inácio de Loyola à Jerusalém

Tiveram vento tão violento de popa, que chegaram de Barcelona a Gaeta em cinco dias com as suas noites, ainda que com muito medo de todos, pela muita tempestade. Por toda aquela terra se temia a peste, mas ele, logo que desembarcou, começou a caminhar para Roma. Dos que vinham na nave, juntaram-se em sua compa-nhia, uma mãe, com uma filha que vestia roupas de rapaz, e um outro moço. Estes seguiam-no porque também mendigavam.

Chegados a uma herdade, encontraram uma grande fogueira e muitos soldados à volta dela, os quais lhes deram de comer e lhes davam muito vinho, convidando-os, de maneira que parecia quererem embebedá-los. Depois separaram-nos, pondo a mãe e a filha em cima, num quarto, e o peregrino com o moço, no estábulo. Mas quando chegou a meia noite, ouviu que lá em cima se davam grandes gritos: e levantando-se para ver o que era, encontrou a mãe e a filha em baixo, no pátio, muito chorosas, queixando-se que as queriam forçar. A ele [peregrino] veio-lhe, por causa disso, um ímpeto tão grande que se pôs a gritar: – Isto se há-de sofrer? – e queixas semelhantes, as quais dizia com tanta eficácia, que todos os da casa ficaram admirados, sem que nenhum lhe fizesse qualquer mal. O moço já tinha fugido, e os três começaram a caminhar assim de noite.

E chegados a uma cidade que estava perto, e não podendo entrar, os três passaram aquela noite, de muita chuva, numa igreja que ali havia. De manhã não quiseram abrir-lhes a cidade e por fora não encontravam esmola, nem sequer num castelo que parecia perto dali, no qual o peregrino se sentiu fraco4, tanto pela viagem por mar, como por tudo o mais, etc. E não podendo caminhar mais, ficou por ali e a mãe e a filha continuaram para Roma.

Aquele dia saiu muita gente da cidade, e sabendo que vinha ali a senhora da terra, pôs-se diante dela, dizendo-lhe que estava doente de pura fraqueza, e pedia-lhe que o deixasse entrar na cidade para buscar algum remédio. Ela concedeu-lho facilmente. E começando a mendigar pela cidade, encontrou muitos quatrins, e refazendo-se ali dois dias, voltou a prosseguir o seu caminho, e chegou a Roma no Domingo de Ramos.

Aqui, todos os que falavam com ele, sabendo que não levava dinheiro para ir a Jerusalém, começaram a dissuadi-lo da ida, afir-mando-lhe com muitas razões que era impossível arranjar passagem sem dinheiro. Mas ele tinha uma grande certeza na sua alma, de tal modo que não podia duvidar de que havia de encontrar modo de ir a Jerusalém.

E tendo recebido a bênção do papa Adriano VI, partiu para Ve-neza, oito ou nove dias depois da Páscoa da Ressurreição. Levava ainda seis ou sete ducados que lhe tinham dado para a passagem de Veneza a Jerusalém e que ele recebera, vencido um pouco pelos temores que lhe incutiam de não poder passar de outra maneira. Mas dois dias depois de ter saído de Roma, começou a ver que aquilo tinha sido desconfiança que tinha tido, e pesou-lhe muito ter aceite os ducados, e pensava se seria bom deixá-los. Mas por fim determinou-se a gastá-los generosamente com aqueles que lhe apareciam, que ordinariamente eram pobres. E fê-lo de tal maneira, que quando depois chegou a Veneza, não levava mais que alguns quatrins, que naquela noite lhe foram necessários.

Todavia, por este caminho até Veneza, por causa dos vigias contra a peste, dormia pelos pórticos. E aconteceu-lhe uma vez, ao levantar-se de manhã, topar com um homem, que ao vê-lo se pôs a correr cheio de medo, porque parece que o viu muito pálido.

Caminhando chegou a Choza e, com alguns companheiros que se lhe tinham juntado, soube que não os deixariam entrar em Veneza. Os companheiros determinaram ir a Pádua, para ali tomar a cédula de saúde, e assim partiu com eles; mas não pôde caminhar tanto, porque caminhavam muito depressa, e deixaram-no, quase de noite, num descampado, onde lhe apareceu Cristo da maneira que lhe costumava aparecer, como dissemos atrás, e confortou-o muito. E com esta consolação, no outro dia de manhã, sem apresentar cédula, como (creio) tinham feito os seus companheiros, chegou à porta de Pádua, e entrou sem que os guardas lhe pedissem nada, e o mesmo lhe aconteceu à saída. Disso se espantaram muito os seus companheiros que acabavam de tomar cédula para ir a Veneza, com a qual ele não se preocupou.

E chegados a Veneza, vieram os guardas ao barco para examinar, um por um, a todos os que ali estavam, e só a ele deixaram. Mantinha-se mendigando, e dormia na praça de São Marcos, e nunca quis ir a casa do embaixador do imperador, nem fazia diligência especial para buscar dinheiro para a passagem. Tinha uma grande certeza na sua alma de que Deus lhe havia de dar modo de ir a Jerusalém e esta certeza o confirmava tanto, que nenhumas razões e medos que lhe punham o faziam duvidar.

Um dia encontrou-o um homem rico, espanhol, e este pergun-tou-lhe o que fazia e onde queria ir, e sabendo da sua intenção, le-vou-o a comer em sua casa, e depois hospedou-o alguns dias até se preparar a partida. Tinha o peregrino este costume, já desde Manresa, que quando comia com outros, nunca falava à mesa, só respondendo brevemente; mas escutava o que se dizia, e retendo algumas coisas, das quais tomasse ocasião de falar de Deus, fazia-o no fim da refeição.

E foi esta causa pela qual o homem de bem, com toda a sua casa, tanto se afeiçoaram a ele, que o quiseram reter e obrigar a ficar em sua casa. E o mesmo hospedeiro levou-o ao duque de Veneza, para que lhe falasse, isto é, alcançou-lhe a entrada e a audiência. O duque, logo que ouviu o peregrino, mandou que lhe dessem embarcação no navio dos governadores que ia para Chipre.

Ainda que naquele ano tinham vindo muitos peregrinos [para ir] a Jerusalém, a maior parte deles tinham voltado para as suas terras, pelo novo caso sucedido da tomada de Rodes.Todavia havia treze na nau peregrina, que partiu primeiro, e oito ou nove ficaram para a dos governadores. Estando esta para partir, veio-lhe ao nosso peregrino uma doença de febres, que depois de o terem incomoda-do alguns dias o deixaram e a nave partia no dia em que ele tinha tomado uma purga. Os da casa perguntaram ao médico se podia embarcar para Jerusalém e o médico disse que para ser sepultado lá, podia embarcar. Mas ele embarcou e partiu aquele dia; e vomitou tanto que ficou aliviado e começou a sarar completamente. Nesta nau cometiam-se algumas indecências e torpezas manifestas, que ele repreendia com severidade.

Os espanhóis que ali iam avisavam-no que não fizesse aquilo, porque os da nau tratavam de o deixar nalguma ilha. Mas quis Deus Nosso Senhor que chegassem depressa a Chipre, onde deixada aquela nave, foram por terra a outro porto que se chama Las Salinas, que estava a dez léguas dali, e entraram na nau peregrina, na qual também não meteu mais para seu mantimento, que a esperança que levava em Deus, como tinha feito na outra. Em todo este tempo aparecia-lhe muitas vezes Nosso Senhor, que lhe dava muita conso-lação e ânimo; mas parecia-lhe que via uma coisa redonda e grande, como se fosse de ouro, que se lhe representava. Depois de partidos de Chipre, chegaram a Jafa.

E caminhando para Jerusalém nos seus burrinhos, como é costume, duas milhas antes de chegar a Jerusalém, um espanhol, nobre, segundo parecia, chamado Diego Manes, disse, com muita devoção, a todos os peregrinos que já que dali a pouco haviam de chegar ao lugar donde se podia ver a cidade santa, seria bom que todos se pre-parassem em suas consciências, e que fossem em silêncio.

E parecendo bem a todos, começou cada um a recolher-se; e um pouco antes de chegar ao lugar donde se via [a cidade], apearam-se, porque viram os frades, com a cruz, que os estavam esperando. E vendo a cidade, teve o peregrino grande consolação; e segundo os outros diziam, foi universal em todos, com uma alegria que não parecia natural; e a mesma devoção sentiu sempre nas visitas dos lugares santos.

-- Da Autobiografia de Santo Inácio de Loyola

25 de jul. de 2015

17º Domingo Comum - 26/07/2015

Jo 6,1-15 
Naquele tempo, 1Jesus foi para o outro lado do mar da Galileia, também chamado de Tiberíades.
2Uma grande multidão o seguia, porque via os sinais que ele operava a favor dos doentes. 3Jesus subiu ao monte e sentou-se aí, com os seus discípulos.
4Estava próxima a Páscoa, a festa dos judeus.
5Levantando os olhos e vendo que uma grande multidão estava vindo ao seu encontro, Jesus disse a Filipe: “Onde vamos comprar pão para que eles possam comer?”
6Disse isso para pô-lo à prova, pois ele mesmo sabia muito bem o que ia fazer.
7Filipe respondeu: “Nem duzentas moedas de prata bastariam para dar um pedaço de pão a cada um”.
8Um dos discípulos, André, o irmão de Simão Pedro, disse: 9“Está aqui um menino com cinco pães de cevada e dois peixes. Mas o que é isto para tanta gente?”
10Jesus disse: “Fazei sentar as pessoas”. Havia muita relva naquele lugar, e lá se sentaram, aproximadamente, cinco mil homens.
11Jesus tomou os pães, deu graças e distribuiu-os aos que estavam sentados, tanto quanto queriam. E fez o mesmo com os peixes.
12Quando todos ficaram satisfeitos, Jesus disse aos discípulos: “Recolhei os pedaços que sobraram, para que nada se perca!”
13Recolheram os pedaços e encheram doze cestos com as sobras dos cinco pães, deixadas pelos que haviam comido. 14Vendo o sinal que Jesus tinha realizado, aqueles homens exclamavam: “Este é verdadeiramente o Profeta, aquele que deve vir ao mundo”.
15Mas, quando notou que estavam querendo levá-lo para proclamá-lo rei, Jesus retirou-se de novo, sozinho, para o monte.
Comentário:
A narrativa deste trecho do Evangelho compõe-se de um sinal, a multiplicação dos pães, e de um discurso sobre o seu significado. O milagre ocorre próximo a Páscoa e inicia pela travessia das águas, no caso o lago de Tiberíades. Após a travessia, realiza-se o milagre dos pães, tudo relembrando nitidamente a travessia do Mar Vermelho e os pães ázimos. Mas esta lembrança não ocorre na sinagoga, sinal da velha aliança, mas na presença de Jesus Cristo, a Nova Aliança.
Leituras Relacionadas
Antigo Testamento
Livros Históricos
  • Êxodo 15, 1-18
  • Êxodo 16, 1-36
  • Números 11, 4-23
  • Deuteronômio 8,1-6
  • 2 Reis 4, 42-44
Livros Sapienciais e Proféticos
  • Isaías 55, 1-5
Evangelhos
  • Mateus 14, 13-21
  • Marcos 6, 30-44
  • Lucas 9, 10-17
Cartas

19 de jul. de 2015

Pode a esposa casar quando o marido desaparece?

Ano passado um avião com mais de 200 pessoas simplesmente sumiu. Por mais buscas que tenham sido realizadas, não foi encontrada uma única parte que possa ser útil para indicar seu destino final, muito menos a localização do que tenha restado. No século 21, mais de 200 pessoas desapareceram deixando famílias para trás. 

Menos espetacular e longe das manchetes, há histórias de pessoas que saíram para ir trabalhar, comprar leite na esquina ou ir numa festa, e nunca mais foram vistas. A polícia é acionada, familiares e amigos espalham notas de procura-se pelo Facebook, jornais, etc... e nada. Parece que evaporaram.

Em situações semelhantes, como fica o casamento católico dos que sobreviveram? Podem eles casar novamente? Apesar de pouco conhecido, a Igreja tem um procedimento determinado para tais casos.

Primeiro, é fundamental salientar que o casamento é para toda vida, assim afirma a teologia e confirma o Código Canônico. Um casamento válido e consumado apenas a morte pode dissolver, nenhum poder humano pode alcançá-lo (cânon 1141). 

Alguém poderia dizer que no caso do avião desaparecido, a situação é simples por que o governo já emitiu os atestados de óbitos para todas vítimas. Já aquele que saiu andando de casa, com boa saúde, e sumiu, pode demorar anos, mas a Justiça acabará também emitindo um atestado de óbito. Logo, o eventual viúvo ou viúva pode casar novamente quando achar outra pessoa. 

Nem tão rápido. Assim como um documento civil de divórcio não determina o final de casamento para a Igreja, também um atestado de óbito não o fará automaticamente. O cônjuge sobrevivente deve procurar seu bispo e solicitar uma declaração de morte presumida. O bispo, ouvindo as testemunhas e verificando as provas materiais, dentro das circunstâncias apresentadas, pode determinar com "certeza moral" o falecimento. O cânon 1707 trata do assunto.

Certeza moral é um conceito frequente na teologia moral e em várias situações do direito canônico. Pode-se dizer que é o equivalente ao padrão legal de "além de qualquer dúvida"e significa que a Igreja, utilizando da melhor maneira os fatos conhecidos, sem ser onisciente, toma uma decisão, mesmo sem estar 100% segura do ocorrido. Como seres humanos, bispos podem estar plenamente convencidos de que um fato ocorreu, mas sempre há a possibilidade estar errado, afinal somos falíveis. Mas, muitas vezes, a "certeza moral" é suficiente e a única forma possível de decidir em casos em que alguma ação se faz necessária, por isso Igreja entende que é suficiente.

Com base em decisão do bispo, o casamento é automaticamente reconhecido como concluído, e temos, então, um viúvo ou viúva que pode casar dentro da fé cristã. 

Mas digamos que, após anos e anos, já o segundo casamento plenamente válido e consumado, reaparece o primeiro marido. Coisas de novelas acontecem também na vida real. Qual a solução da Igreja? Como já observado, um casamento só pode ser dissolvido com a morte de um dos cônjuges, e aquele que se considerava morto, descobre-se estar vivo. A consequência lógica e imediata é que o primeiro casamento ainda é válido e o segundo, baseado em um erro de julgamento, não é válido. 

Obviamente esta seria um experiência extremante dolorosa e lastimável, de erros humanos que podem afetar muitas vidas e obrigaria o bispo a usar de grande caridade para lidar com as consequências adequadamente. Mas para a Igreja, a situação é clara: não morreu, o casamento não terminou! Felizmente não é uma situação comum, mas que está prevista no Código Canônico por não ser inédita.

Para quem se interessar, eis um link para o Código Canônico.

-- Autoria própria

18 de jul. de 2015

16º Domingo Comum - 19/07/2015

Mc 6,30-34 
Naquele tempo, 30os apóstolos reuniram-se com Jesus e contaram tudo o que haviam feito e ensinado.
31Ele lhes disse: “Vinde sozinhos para um lugar deserto e descansai um pouco”. Havia, de fato, tanta gente chegando e saindo que não tinham tempo nem para comer.
32Então foram sozinhos, de barco, para um lugar deserto e afastado. 33Muitos os viram partir e reconheceram que eram eles. Saindo de todas as cidades, correram a pé, e chegaram lá antes deles.
34Ao desembarcar, Jesus viu uma numerosa multidão e teve compaixão, porque eram como ovelhas sem pastor. Começou, pois, a ensinar-lhes muitas coisas.
Comentário:
Neste trecho, São Marcos retoma uma questão central: Quem éJesus? (Mc 1, 22-27; 2,7; 4,41). Tem-se uma reposta, principalmente considerando os profetas (Jr 23,1-6; Ez 34,8-23; Zc 10,2): Jesus é o verdadeiro Pastor prometido, aquele que dá vida para suas ovelhas, uma multidão delas que vai até o deserto para procurá-lo. 
Leituras Relacionadas
Antigo Testamento
Livros Históricos
Livros Sapienciais e Proféticos
  • Jeremias 23, 1-6
  • Ezequiel 34, 1-31
  • Zacarias 10, 1-2
Evangelhos
  • Marcos 1, 21-28
  • Marcos 2,1-12
  • Marcos 4, 35-41
Cartas


17 de jul. de 2015

Os sofrimentos e a glória dos mártires

A Crucificação de São Pedro, Michelangelo de Caravaggio
Consideremos a sabedoria de Paulo. Que diz ele? Eu entendo que os sofrimentos do tempo presente nem merecem ser comparados com a glória que deve ser revelada em nós (Rm 8,18). Por que, exclama, me falais das feridas, dos tormentos, dos altares, dos algozes, dos suplícios, da fome, do exílio, das privações, dos grilhões e das algemas? Ainda que invoqueis todas as coisas que atormentam os homens, nada podeis mencionar que esteja à altura daqueles prêmios, daquelas coroas, daquelas recompensas. Pois as provações cessam com a vida presente, ao passo que a recompensa é imortal, permanecendo para sempre.

Também isto insinuava o Apóstolo em outro lugar, quando dizia: O que no presente é insignificante e momentânea tribulação (cf. 2Cor 4,17). Ele diminuía a quantidade pela qualidade, e alivia a dureza pelo breve espaço de tempo. Como as tribulações que então sofriam eram penosas e duras por natureza, Paulo se serve de sua brevidade para diminuir-lhe a dureza, dizendo: O que no presente é insignificante e momentânea tribulação, acarreta para nós uma glória eterna e incomensurável. E isso acontece, porque voltamos os nossos olhares para as coisas invisíveis e não para as coisas visíveis. Pois o que é visível é passageiro, mas o que é invisível é eterno (cf. 2Cor 4,17-18).

Vede como é grande a glória que acompanha a tribulação! Vós mesmos sois testemunhas do que dizemos. Antes mesmo que os mártires tenham recebido as recompensas, os prêmios, as coroas, enquanto ainda se vão transformando em pó e cinza, já acorremos com entusiasmo para honrá-los, convocando uma assembleia espiritual, proclamando o seu triunfo, exaltando o sangue que derramaram, os tormentos, os golpes, as aflições e as angústias que sofreram. Assim, as próprias tribulações são para eles uma fonte de glória, mesmo antes da recompensa final.

Tendo refletido sobre estas coisas, irmãos caríssimos, suportemos generosamente todas as adversidades que sobrevierem. Se Deus as permite, é porque são úteis para nós. Não percamos a esperança nem a coragem, prostrados pelo peso dos sofrimentos, mas resistamos com fortaleza e demos graças a Deus pelos benefícios que nos concedeu. Deste modo, depois de gozarmos dos seus dons na vida presente, alcançaremos os bens da vida futura, pela graça, misericórdia e bondade de nosso Senhor Jesus Cristo. A ele pertencem a glória e o poder, com o Espírito Santo, agora e sempre e pelos séculos. Amém.

--Das Homilias de São João Crisóstomo, bispo (século IV)

16 de jul. de 2015

Maria concebeu primeiro em seu espírito, e depois em seu corpo

Uma virgem da descendência real de Davi foi escolhida para a sagrada maternidade; iria conceber um filho, Deus e homem, primeiro em seu espírito, e depois em seu corpo. E para evitar que, desconhecendo o desígnio de Deus, ela se perturbasse perante efeitos tão inesperados, ficou sabendo, no colóquio com o anjo, que era obra do Espírito Santo o que nela se realizaria. Maria, pois, acreditou que, estando para ser em breve Mãe de Deus, sua pureza não sofreria dano algum. Como duvidaria desta concepção tão original, aquela a quem é prometida a eficácia do poder do Altíssimo? A sua fé e confiança são ainda confirmadas pelo testemunho de um milagre anterior: a inesperada fecundidade de Isabel. De fato, quem tornou uma estéril capaz de conceber, pode também fazer com que uma virgem conceba.

Portanto, a Palavra de Deus, que é Deus, o Filho de Deus, que no princípio estava com Deus, por quem tudo foi feito e sem ela nada se fez (cf. Jo 1,2-3), a fim de libertar o homem da morte eterna, se fez homem. Desceu para assumir a nossa humildade, sem diminuir a sua majestade. Permanecendo o que era e assumindo o que não era, uniu a verdadeira condição de escravo à condição segundo a qual ele é igual a Deus; realizou assim entre as duas naturezas uma aliança tão admirável que, nem a inferior foi absorvida por esta glorificação, nem a superior foi diminuída por esta elevação.

Desta forma, conservando-se a perfeita propriedade das duas naturezas que subsistem em uma só pessoa, a humildade é assumida pela majestade, a fraqueza pela força, a mortalidade pela eternidade. Para pagar a dívida contraída pela nossa condição pecadora, a natureza invulnerável uniu-se à natureza passível; e a realidade de verdadeiro Deus e verdadeiro homem associa-se na única pessoa do Senhor. Por conseguinte, aquele que é um só mediador entre Deus e os homens (1Tm 2,5), como exigia a nossa salvação, morreu segundo a natureza humana e ressuscitou segundo a natureza divina. Com razão, pois, o nascimento do Salvador conservou intacta a integridade virginal de sua mãe; ela salvaguardou a pureza, dando à luz a Verdade.  

Tal era, caríssimos filhos, o nascimento que convinha a Cristo, poder e sabedoria de Deus. Por este nascimento, ele é semelhante a nós pela sua humanidade, e superior a nós pela sua divindade. De fato, se não fosse verdadeiro Deus, não nos traria o remédio; se não fosse verdadeiro homem, não nos serviria de exemplo.  

Por isso, quando o Senhor nasceu, os anjos cantaram cheios de alegria: Glória a Deus no mais alto dos céus, e anunciaram paz na terra aos homens por ele amados (Lc 2,14). Eles veem, efetivamente, a Jerusalém celeste ser construída pelos povos do mundo inteiro. Por tão inefável prodígio da bondade divina, qual não deve ser a alegria da nossa humilde condição humana, se até os sublimes coros dos anjos se rejubilam?

-- Dos Sermões, de São Leão Magno, papa (século V)

11 de jul. de 2015

15º Domingo do Tempo Comum - 12/07/2015

Mc 6,7-13

Naquele tempo, 7Jesus chamou os doze, e começou a enviá-los dois a dois, dando-lhes poder sobre os espíritos impuros.
8Recomendou-lhes que não levassem nada para o caminho, a não ser um cajado; nem pão, nem sacola, nem dinheiro na cintura. 9Mandou que andassem de sandálias e que não levassem duas túnicas.
10E Jesus disse ainda: “Quando entrardes numa casa, ficai ali até vossa partida. 11Se em algum lugar não vos receberem, nem quiserem vos escutar, quando sairdes, sacudi a poeira dos pés, como testemunho contra eles!”
12Então os doze partiram e pregaram que todos se convertessem. 13Expulsavam muitos demônios e curavam numerosos doentes, ungindo-os com óleo.
Comentários:
Rejeitado pelos seus (6, 1-6), Jesus continua seu ministério dando-lhes a tarefa de também pregar o Evangelho (Mc 3, 15). Como Israel rejeitou Jesus Cristo, não é posta nenhuma restrição ao seu apostolado (Mt 10, 6). As instruções são poucas: apresentar-se pobremente;  contentar-se com o que lhes for dado (Mt 10, 11); e não impor seu ensinamento, mas anunciá-lo aos homens livres. 
Leituras Relacionadas
Antigo Testamento
Livros Históricos
Livros Sapienciais e Proféticos
  • Amós 7, 12-15
Evangelhos
  • Mateus 10, 6-11
  • Marcos 3, 15
  • Marcos 6, 1-6
  • Lucas 9, 3-6
Cartas
  • Efésios 1, 3-18
  • Tiago 5, 14-16

8 de jul. de 2015

Celebração da Eucaristia no século II

Dai graças assim, primeiro sobre o cálice: “Nós te damos graças, Pai nosso, pela santa videira de Davi, teu servo, que nos deste a conhecer por Jesus, teu servo; a ti a glória pelos séculos”.

            Em seguida, sobre o pão partido: “Nós te damos graças, ó Pai nosso, pela vida e ciência que nos deste a conhecer por Jesus, teu servo; a ti a glória pelos séculos. Do mesmo modo como este pão estava espalhado pelos montes e, colhido, tornou-se uma só coisa, assim, desde os confins da terra, se reúne tua Igreja em teu reino; porque te pertencem a glória e o poder, por Jesus Cristo, nos séculos”.

            Ninguém coma ou beba da vossa eucaristia que não tenha sido batizado em nome do Senhor. De fato, sobre isto disse ele: Não jogueis aos cães as coisas santas.

            Refeitos, dai graças assim: “Nós te damos graças, Pai santo, por teu santo nome, cujo trono puseste em nossos corações, e pela ciência, pela fé e imortalidade, que nos manifestaste por Jesus, teu servo; a ti a glória pelos séculos”. Senhor onipotente, tu criaste tudo por causa de teu nome, deste aos homens o alimento e a bebida, a fim de te agradecerem; a nós, porém, concedeste o alimento e a bebida espirituais e a vida eterna, por teu servo. Antes de tudo te damos graças por seres poderoso; a ti a glória pelos séculos.

            Lembra-te, Senhor, de tua Igreja para defendê-la de todo mal e torná-la perfeita em tua caridade; reúne-a, santificada, dos quatro ventos em teu reino que lhe preparaste; porque teu é o poder e a glória pelos séculos.

            Venha a graça e passe este mundo! Hosana ao Deus de Davi! Quem é santo, aproxime-se; se não o for, faça penitência; Maranatha, amém.

            Congregados no dia do Senhor, parti o pão e dai graças, depois de terdes confessado vossos pecados, a fim de ser puro vosso sacrifício. Todo aquele, porém, que tiver uma desavença com seu companheiro, não se junte a vós antes de se terem reconciliado, para que não seja profanado vosso sacrifício. Pois foi o Senhor que disse: Em todo lugar e em todo tempo oferecer-me-eis um sacrifício puro, porque sou o grande rei, diz o Senhor, e é admirável o meu nome entre as nações.

-- Do antigo opúsculo “Doutrina dos doze Apóstolos” (século II)

7 de jul. de 2015

Aqueles que estão de fora, queiram ou não, são nossos irmãos

Um bispo ortodoxo, um católico e um anglicano celebrando em conjunto por que,
como dz Santo Agostinho, todos rezamos o Pai Nosso. 
Irmãos, exortamos-vos instantemente à caridade, não apenas entre vós, mas também em relação aos que estão de fora, quer sejam os ainda pagãos e descrentes, quer se tenham separado de nós, e de modo que, professando conosco a Cabeça, separaram-se do corpo. Sintamos pesar por eles, irmãos, porque eles continuam sendo nossos irmãos. Quer queiram, quer não queiram, são nossos irmãos. De fato, só deixariam de ser nossos irmãos se deixassem de dizer: Pai nosso.

Assim o Profeta falou de alguns: Àqueles que vos dizem: Não sois irmãos nossos, respondei: Sois nossos irmãos. Observai de quem se poderia dizer isto, será que dos pagãos? Não, pois nem os chamamos de nossos irmãos segundo as Escrituras e o modo de tratar da Igreja. Será que dos judeus que não creram em Cristo?

Lede o Apóstolo e notai que quando fala de “irmãos” sem mais, somente se refere aos cristãos: Tu, porém, por que julgas teu irmão, ou tu, por que desprezas teu irmão? E em outro trecho: Vós cometeis a iniqüidade e a fraude e isto fazeis contra irmãos.

Por conseguinte, aqueles que dizem: “Não sois nossos irmãos”, estão nos chamando de pagãos. Por isso eles querem batizar-nos de novo, declarando que não possuímos o que dão. Por conseguinte, seu erro consiste em negar que somos seus irmãos. Mas então por que nos disse o Profeta: Quanto a vós, respondei-lhes: Sois nossos irmãos; a não ser porque reconhecemos neles aquele batismo que não repetimos? Não aceitando nosso batismo, eles negam que somos seus irmãos. Nós, porém, não repetindo o deles, mas reconhecendo-o como nosso, dizemos: Sois nossos irmãos.

Se eles disserem: “Por que nos procurais? Que quereis de nós?” respondamos: Sois nossos irmãos. Mesmo que nos digam: “Podeis ir embora, nada temos convosco!” Pelo contrário, nós temos muito convosco! Nós confessamos um mesmo Cristo, e assim devemos estar em um só Corpo, sob uma só Cabeça.

Portanto, nós vos suplicamos, irmãos, por aquelas mesmas entranhas da caridade, cujo leite nos alimenta, cujo pão nos fortalece, isto é,por Cristo, nosso Senhor. Com efeito, é agora a ocasião de termos para com eles grande caridade, muita misericórdia, rogando a Deus por eles, a fim de que lhes conceda sobriedade de pensamento para caírem em si e enxergarem, porque nada absolutamente têm a dizer contra a verdade. De fato, apenas lhes resta a fraqueza da animosidade, tanto mais enferma quanto mais julga possuir maior força. Assim, pela mansidão de Cristo, nós vos conjuramos suplicando em favor dos fracos, dos sábios segundo a carne, dos puramente humanos e carnais, mas ainda nossos irmãos, que freqüentam os mesmos sacramentos, embora não conosco, mas os mesmos. Eles respondem um só Amém, embora não conosco, mas o mesmo. Portanto, derramai diante de Deus por eles o âmago de vossa caridade.

-- Dos Comentários sobre os Salmos, de Santo Agostinho, bispo (século V)

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