19 de jul. de 2015

Pode a esposa casar quando o marido desaparece?

Ano passado um avião com mais de 200 pessoas simplesmente sumiu. Por mais buscas que tenham sido realizadas, não foi encontrada uma única parte que possa ser útil para indicar seu destino final, muito menos a localização do que tenha restado. No século 21, mais de 200 pessoas desapareceram deixando famílias para trás. 

Menos espetacular e longe das manchetes, há histórias de pessoas que saíram para ir trabalhar, comprar leite na esquina ou ir numa festa, e nunca mais foram vistas. A polícia é acionada, familiares e amigos espalham notas de procura-se pelo Facebook, jornais, etc... e nada. Parece que evaporaram.

Em situações semelhantes, como fica o casamento católico dos que sobreviveram? Podem eles casar novamente? Apesar de pouco conhecido, a Igreja tem um procedimento determinado para tais casos.

Primeiro, é fundamental salientar que o casamento é para toda vida, assim afirma a teologia e confirma o Código Canônico. Um casamento válido e consumado apenas a morte pode dissolver, nenhum poder humano pode alcançá-lo (cânon 1141). 

Alguém poderia dizer que no caso do avião desaparecido, a situação é simples por que o governo já emitiu os atestados de óbitos para todas vítimas. Já aquele que saiu andando de casa, com boa saúde, e sumiu, pode demorar anos, mas a Justiça acabará também emitindo um atestado de óbito. Logo, o eventual viúvo ou viúva pode casar novamente quando achar outra pessoa. 

Nem tão rápido. Assim como um documento civil de divórcio não determina o final de casamento para a Igreja, também um atestado de óbito não o fará automaticamente. O cônjuge sobrevivente deve procurar seu bispo e solicitar uma declaração de morte presumida. O bispo, ouvindo as testemunhas e verificando as provas materiais, dentro das circunstâncias apresentadas, pode determinar com "certeza moral" o falecimento. O cânon 1707 trata do assunto.

Certeza moral é um conceito frequente na teologia moral e em várias situações do direito canônico. Pode-se dizer que é o equivalente ao padrão legal de "além de qualquer dúvida"e significa que a Igreja, utilizando da melhor maneira os fatos conhecidos, sem ser onisciente, toma uma decisão, mesmo sem estar 100% segura do ocorrido. Como seres humanos, bispos podem estar plenamente convencidos de que um fato ocorreu, mas sempre há a possibilidade estar errado, afinal somos falíveis. Mas, muitas vezes, a "certeza moral" é suficiente e a única forma possível de decidir em casos em que alguma ação se faz necessária, por isso Igreja entende que é suficiente.

Com base em decisão do bispo, o casamento é automaticamente reconhecido como concluído, e temos, então, um viúvo ou viúva que pode casar dentro da fé cristã. 

Mas digamos que, após anos e anos, já o segundo casamento plenamente válido e consumado, reaparece o primeiro marido. Coisas de novelas acontecem também na vida real. Qual a solução da Igreja? Como já observado, um casamento só pode ser dissolvido com a morte de um dos cônjuges, e aquele que se considerava morto, descobre-se estar vivo. A consequência lógica e imediata é que o primeiro casamento ainda é válido e o segundo, baseado em um erro de julgamento, não é válido. 

Obviamente esta seria um experiência extremante dolorosa e lastimável, de erros humanos que podem afetar muitas vidas e obrigaria o bispo a usar de grande caridade para lidar com as consequências adequadamente. Mas para a Igreja, a situação é clara: não morreu, o casamento não terminou! Felizmente não é uma situação comum, mas que está prevista no Código Canônico por não ser inédita.

Para quem se interessar, eis um link para o Código Canônico.

-- Autoria própria

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