21 de jan. de 2019

Políticos pró-aborto são automaticamente excomungados? Provavelmente não!

Estaria todo político pró-aborto automaticamente excomungado da Igreja Católica, em virtude de seu apoio e ações práticas favoráveis a uma prática explicitamente contrária à vida humana? 

Vou dar duas respostas, uma curta, outra longa, mas para ambas é fundamental lembrar da parábola do Filho Pródigo (Lc 11, 15-32), que saiu a gastar a fortuna do pai em festas, bebedeiras e mulheres. Quando se arrependeu e retornou a casa do pai (a Igreja), foi acolhido de braços abertos pelo Pai que correu ao seu encontro. A Igreja está sempre de braços abertos àqueles que se arrependem, pois ela busca a salvação de almas, não formar uma sociedade de homens perfeitos, o que seria impossível, pois somos todos pecadores.

Resposta curta
O aborto é citado uma única vez no Código de Direito Canônico (CDC) e em pouquíssimas palavras:

Cân. 1398 — Quem procurar o aborto, seguindo-se o efeito, incorre em excomunhão latae sententiae.

A expressão latina "latae sententiae" indica que a pena de excomunhão pode ser aplicada sem haver um julgamento, como testemunhas e advogados de defesa ou acusação, a pena seria automática. Mas veja que ela aplica-se apenas a quem participar ativamente de um aborto, ou seja, a mãe, o pai, médicos e enfermeiras, pois eles tem a clara intenção de provocar um aborto. O caso da equipe médica é bastante claro no cânone 1329, parágrafo 2, que afirma que a pena de excomunhão pode ser estendida aos cúmplices de um delito, se este não ocorresse sem a sua participação. neste caso, pode ser incluído também os pais que derem dinheiro para a filha cometer o aborto.

Porém, é possível argumentar que um político ao defender o aborto, ou até mesmo votar em uma lei pró-aborto, não está participando diretamente de nenhum aborto, cada mãe é que está tomando livremente a decisão. Em favor de tais políticos, o canon 18 é bastante claro para dizer que "são de interpretação estrita as leis que estabelecem alguma pena". Por esta razão, advogados canônicos afirmam que a excomunhão automática não se aplica a políticos pró-aborto (ver 1 e 2).

A resposta longa explora outras alternativas e quais penas podem ser aplicadas, por que é óbvio que tais políticos não estão em comunhão plena com os ensinamentos da Igreja.

Resposta longa

Há outras ações em que a pena de excomunhão pode ser aplicada. Por exemplo, o cânon 1364 indica que apostasia, heresia e cisma implicam em excomunhão latae sententiae, e que isto poderia ser aplicado a políticos pró-aborto. Apostasia ocorre quando uma pessoa repudia a fé cristã; heresia é a negação insistente de uma verdade fundamental da fé Católica, inspirada de maneira divina; e cisma é a negação em se submeter à autoridade do Papa e da Igreja, expressa pelos seus bispos.

Um político que se declara católico, ou seja, acredita em um Deus único, criador do céu e da terra, etc...  certamente não está em apostasia; cisma também não é o caso por que tal político ão está negando a autoridade do padre ou bispos. Restaria, talvez, a heresia.

Heresia aplica-se somente as verdades universais da Igreja, inspiradas pelo Espírito Santo, escritas nas Sagradas Escrituras, ou declaradas como divinas pelo magistério solene da Igreja. Por exemplo, declarar-se contrária à Ressureição de Jesus Cristo seria uma heresia, pois isto está atestado em diversas passagens bíblicas, além de 2000 anos de ensinamento da Igrejas. Em um comentário escrito pelo então Cardeal Ratzinger sobre o motu porprio Ad Tuendam Fidem, ele afirma que todo fiel deve dar firme e claro testemunho sobre a grave imoralidade do assassinato direto ou indireto da vida humana inocente pois isto está de acordo com o Magistério da Igreja. É claro que votar a favor do aborto é um testemunho contrário à santidade da vida, logo pode ser considerado heresia.

O que pode ser dito em favor de tais políticos, após este ensinamento claro da Igreja? Vejamos o cânon 1323, que lista várias posibilidades de exclusão de penas:

Cân. 1323 — Não está sujeito a nenhuma pena aquele que, ao violar a lei ou o
preceito:
 l.° ...
 2.° sem culpa ignorava que infringia a lei ou o preceito
  ...

Há outras razões na lista, como ser maior de 16 anos ou estar agindo em legítima defesa, que não se aplicariam a tais políticos. Agora deve-se considerar as deficiências da própria Igreja: certamente nas aulas de catequese para primeira comunhão ninguém discute aborto e a santidade da vida; talvez na catequese de Crisma algo seja falado, e na maioria das missas o assunto não é discutido. Quem realmente tem conhecimento dos preceitos da Igreja, em todos detalhes e motivações? Eu diria que maioria dos políticos, que só aparecem na Igreja em casamentos, batizados e época de eleições, jamais ouviram uma boa catequese sobre a vida humana.

Por outro lado, este tema tem sido discutido, mesmo que superficialmente, por muitos anos através da imprensa, tornando quase impossível alguém com razoável cultural não conhecer o ponto principal da Igreja: a vida humana inicia na concepção e, mesmo no ventre da mão, deve ser preservada e defendida. Neste sentido, pode-se dizer que católicos que votam a  favor do aborto estão, no mínimo, dando um escândalo para outros fiéis e cometendo um pecado grave contra a vida humana.  Isto os colocaria no alcance do cânon 915:

Cân. 915 — Não sejam admitidos à sagrada comunhão ...  outros que obstinadamente perseverem em pecado grave manifesto.

Devido ao caráter público da atividade política, seria adequado que bispos e padres tornem públicas suas decisões, mas também seria pastoral que, antes, convidassem estes políticos para uma conversa de caráter particular, explicando os motivos desta eventual punição e dando uma clara oportunidade para o arrependimento.

Um bispo pode também impor a pena de excomunhão após claramente advertir tais políticos, pedir que mudem sua atitude e retomem a plena comunhão com a Igreja (canône 1318). Neste caso, o objetivo é proteger a alma de todos fiéis para que não se deixem levar pelo pecado público de outros.  Uma pessoa excomungada não está fora da Igreja, seu Batismo continua plenamente válido, e caso de arrependem, podem conversar seus pecados, receber a absolvição e serem plenamente reintegrados à Igreja, inclusive recebendo a Sagrada Eucaristia.

Por isso é bom lembrar que qualquer tipo de punição que seja aplicada, é sinal que um pecado foi cometido. Não há nenhum motivo para outros católicos se alegrarem com tal situação, mas sim há motivos para rezar pela alma daqueles que estão em pecado, sejam políticos ou não. E, finalmente, excomunhão é um assunto sério dentro da Igreja Católica, não é uma arma política para ser utilizada em época de campanha eleitoral.

-- autoria própria

Link para o Código de Direito Canônico em português

PS: o texto fala sempre de políticos, mas os argumentos também são válidos para juízes que tomam decisões contrárias à vida, porém, dependendo do caso, juízes podem estar diretamente facilitando um aborto específico.


11 de jan. de 2019

Os sinais do batismo do Senhor

O evangelho nos conta que o Senhor foi ao Jordão para ser batizado e quis ser consagrado neste rio por sinais do céu.
Não é sem razão que celebramos esta festa pouco depois do dia do Natal do Senhor, já que os dois acontecimentos se verificaram na mesma época, embora com diferença de anos; julgo que também ela deve chamar-se festa do Natal.
No dia do Natal, Cristo nasceu entre os homens; hoje renasce pelos sinais sagrados; naquele dia, nasceu da Virgem; hoje é gerado pelos sinais do céu. No Natal, ao nascer o Senhor segundo a natureza humana, Maria, sua mãe, o acaricia em seu colo; agora, ao ser gerado entre os sinais celestes, Deus, seu Pai, o envolve com sua voz, dizendo: Este é o meu filho amado, no qual eu pus todo o meu agrado. Escutai-o (Mt 17,5). Sua mãe o traz nos braços com ternura, seu Pai lhe presta o testemunho de amor. A Mãe apresenta-o aos magos para que o adorem, o Pai apresenta-o às nações para que o reverenciem.
O Senhor Jesus foi, portanto, receber o batismo e quis que seu santo corpo fosse lavado nas águas.
Talvez alguém diga: “Se ele era santo, por que quis ser batizado?” Escuta: Cristo foi batizado, não para ser santificado pelas águas, mas para santificá-las e para purificar as torrentes com o contato de seu corpo. A consagração de Cristo é sobretudo a consagração da água.
Assim, quando o Salvador é lavado, todas as águas ficam puras para o nosso batismo; a fonte é purificada para que a graça batismal seja concedida aos povos que virão depois. Cristo nos precede no batismo para que os povos cristãos sigam confiantemente o seu exemplo. Vejo aqui um significado misterioso: também a coluna de fogo ia na  frente através do mar Vermelho, para que os filhos de Israel a seguissem corajosamente no caminho; foi a primeira a atravessar as águas, a fim de abrir caminho aos que vinham atrás. Este acontecimento, como diz o Apóstolo, era uma figura do batismo. Foi certamente uma espécie de batismo, no qual os homens eram cobertos pela nuvem e passavam através das ondas.
Tudo isso foi realizado pelo mesmo Cristo nosso Senhor, que agora, na coluna do seu corpo, precede no batismo os povos cristãos, como outrora, na coluna de fogo, precedeu através do mar os filhos de Israel. Sim, é a mesma coluna que outrora iluminou os olhos dos caminhantes que hoje enche de luz os corações dos que creem. Outrora abriu um caminho seguro entre as ondas, hoje firma no batismo os passos da nossa fé.

-- Dos Sermões de São Máximo de Turim, bispo (século V)

1 de jan. de 2019

Santo Papa Paulo VI, o papa que moldou a Igreja atual

Diácono Montini no dia de sua ordenação.
Giovanni Battista Enrico Antonio Maria Montini nasceu em 26 de Setembro de 1897, seu pai era advogado, jornalista e membro do parlamento italiano, sua mãe vinha de uma família de nobres. Estudou em uma escola mantida pelos jesuítas, depois passou para a escola pública, onde completou o ensino médio. Entrou direto no Seminário em 1916, com 18 anos, e foi ordenado padre em 29 de Maio de 1920. No mesmo ano defendeu sua tese e obteve um doutorado em Direito Canônico, isto com apenas 22 anos. 

Atividades no Vaticano

Em 1920, começou a trabalhar na Secretaria de Estado do Vaticano e em 1923 foi nomeado Núncio Apostólico para a Polônia. Ao ver a política do país e o nacionalismo fanático da população, escreveu avisando que a paz em que estavam vivendo era apenas uma situação transitória entre duas guerras. De fato, a I Grande Guerra já havia sido concluída e a II Grande Guerra começaria justamente pelo ataque a Polônia. 

Retornou a Roma em 1931 como responsável pelo treinamento de novos diplomatas, em 1937 o então Secretário de Estado Cardeal Pacelli o nomeou para o segundo posto na secretaria. Em 1939, quando Pacelli foi eleito Papa Pio XII, manteve a posição, agora trabalhando junto com o novo Secretário de Estado Luigi Maglione. Devido a sua posição, reunia-se com o Papa praticamente todos os dias, até 1954. 

Durante a guerra coordenou os esforços de ajuda aos perseguidos. Apenas na residência de verão dos Papas, Castel Gandolfo, 15 mil pessoas foram abrigadas, eram soldados aliados que haviam fugido dos campos de prisioneiros, judeus ou comunistas; e depois da liberação de Roma, também soldados alemães que haviam auxiliado a Igreja. Giovanni Montini também era responsável pela troca de mensagens secretas entre as igrejas e conventos onde haviam outros refugiados, em seis anos de guerra, foram 10 milhões de mensagens e pedidos de ajuda.

Arcebispo de Milão

Em 1954 foi nomeado Arcebispo de Milão e Secretário da Conferência dos Bispos Italianos, o Papa Pio XII, que já estava adoentado, anuncio da sua cama a nomeação de Montini como um presente para o povo de Milão. Como bispo, ele reorganizou as estruturas de assistência aos pobres da cidade. Uma das suas iniciativas mais importantes foi o programa "Mil vozes", quando todos 500 padres, seminaristas e muitos leigos da diocese foram chamados a anunciar o Evangelho onde o povo se encontrasse: fábricas, casa, escolas, parques, hospitais, hotéis, etc... 

No consistório que elegeu o Papa João XXIII, mesmo não sendo cardeal, Arcebispo Montini foi votado para suceder Pio XII. Quando o Concílio Vaticano II foi anunciado, ele foi indicado como membro da Comissão de Preparação e, a pedido do Papa, passou a morar em Roma. Além do concílio, foi enviado pelo Papa para representá-lo em diversos países, na África, Brasil e Estados Unidos.  

Papa PauloVI

Em 21 de Junho de 1963 foi escolhido como o novo Papa, assumindo o nome de Paulo VI. No seu diário escreveu: "Antes eu já era solitário, mas agora minha solidão é completa". Sua primeira decisão fundamental foi concluir o Concílio Vaticano II, emfrentando grandes controvérsias dentro e fora da Igreja. Apesar de tudo, em 8 de Dezembro de 1965 o Concílio foi concluído e seus textos publicados. A parte mais visível é a autorização para celebrar missas na língua de cada país, mas há outros aspectos fundamentais para a Igreja, como o chamado a santidade para todos membros da Igreja, a aproximação com outras igrejas cristãs e reorganização da Curia Romana.  

Além disso, escreveu encíclicas que são decisivas para a Igreja atual: Mysterium Fidei, onde reafirma a presença de Cristo na Eucaristia; Populorum Progressio, sobre a necessidade de salários justos e boas condições de trabalhos para todos; Sacerdotalis Caelibatus, sobre a prática de celibato por padres na igreja ocidental; e, acima de todas, Humanae Vitae, sobre o verdadeiro amor conjugal, que inclui uma discussão sobre práticas de contracepção:

O amor conjugal exprime a sua verdadeira natureza e nobreza, quando se considera na sua fonte suprema, Deus que é Amor (1Jo 4, 8), "o Pai, do qual toda a paternidade nos céus e na terra toma o nome". (Ef 3, 15)

O matrimônio não é, portanto, fruto do acaso, ou produto de forças naturais inconscientes: é uma instituição sapiente do Criador, para realizar na humanidade o seu desígnio de amor. Mediante a doação pessoal recíproca, que lhes é própria e exclusiva, os esposos tendem para a comunhão dos seus seres, em vista de um aperfeiçoamento mútuo pessoal, para colaborarem com Deus na geração e educação de novas vidas.

Depois, para os batizados, o matrimônio reveste a dignidade de sinal sacramental da graça, enquanto representa a união de Cristo com a Igreja. 

Ainda como Papa, elegeu como cardeais seus três sucessores: Alberto Luciano (João Paulo I), Karol Wojtyla (João Paulo II) e Joseph Ratzinger (Bento XVI). 

Morte e canonização

Em 14 de Julho de 1978, o Papa Paulo VI estava bastante adoentado e foi para Castel Gandolfo repoousar. Tinha problemas de respiração e necessitava de oxigênio. No domingo 6 de Agosto, participou da Missa da Missa do seu leito. ao receber a Eucaristia, sofreu um ataque cardíaco, mas resistiu por mais três horas, falecendo às 21:41. Por seu pedido, foi enterrado na terra, na cripta do Vaticano e não em uma tomba ornamentada.  


Dois milagres de cura foram reconhecidos pelo Vaticano, ambos de crianças ainda no ventre das suas mães, que nasceram saudáveis após seus pais orarem pela intercessão do santo. Sua canonização ocorreu em 14 de Outubro de 2018, tendo sido celebrada pelo Papa Francisco. 

-- autoria própria

Os sete santos canonizados em 14 de Outubro de 2018.

Em 14 de Outubro, o Papa Francisco canonizou sete novos santos. Os dois primeiros na lista até foram citados na imprensa por serem um pouco mais conhecidos, os outros cinco nem o nome apareceu, e no entanto também são exemplos para todos nós. Este post serve como um link para cada a biografia de cada um deles:

  • Papa Paulo VI: uma vida dedicada à Igreja, suas mudanças moldaram a Igreja atual. 
  • Dom Oscar Romero: arcebispo de San Salvador, capital de El Salvador, foi assassinado enquanto celebrava uma missa por que denunciava os ataques do governo contra padres e fiéis católicos.
  • Francisco Spinelli: fundou uma ordem religiosa, que foi fechada pelo bispo local por mau administração; persistiu e fundou uma segunda ordem para socorrer os pobres e doentes na Alemanha.
  • Vicente Romano
  • Maria Catarina Kasper: iniciou a Ordem das Servas de Cristo, dedicadas a auxiliar os pobres.
  • Nazária Inácia de Santa Teresa de Jesus
  • Núncio Sulprizio: jovem com vida muito sofrida, morreu de cancer dizendo "Espero que meu sofrimento hoje tenha salvado uma alma de um pecador que iria para o Inferno"


-- autoria própria

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