São Pedro, por Francesco del Cossa, c. 1473. Pinacoteca di Brera, Milan |
Irmãos, exortamos-vos instantemente à caridade, não apenas entre vós, mas também em relação aos que estão de fora, quer sejam os ainda pagãos e descrentes, quer se tenham separado de nós, e de modo que, professando conosco a Cabeça, separaram-se do corpo.
Sintamos pesar por eles, irmãos, porque eles continuam sendo nossos irmãos. Quer queiram, quer não queiram, são nossos irmãos. De fato, só deixariam de ser nossos irmãos se deixassem de dizer: Pai nosso.
Assim o Profeta falou de alguns: Àqueles que vos dizem: Não sois irmãos nossos, respondei: Sois nossos irmãos. Observai de quem se poderia dizer isto, será que dos pagãos? Não, pois nem os chamamos de nossos irmãos segundo as Escrituras e o modo de tratar da Igreja. Será que dos judeus que não creram em Cristo?
Lede o Apóstolo e notai que quando fala de “irmãos” sem mais, somente se refere aos cristãos: Tu, porém, por que julgas teu irmão, ou tu, por que desprezas teu irmão? E em outro trecho: Vós cometeis a iniqüidade e a fraude e isto fazeis contra irmãos.
Por conseguinte, aqueles que dizem: “Não sois nossos irmãos”, estão nos chamando de pagãos. Por isso eles querem batizar-nos de novo, declarando que não possuímos o que dão. Por conseguinte, seu erro consiste em negar que somos seus irmãos. Mas então por que nos disse o Profeta: I; a não ser porque reconhecemos neles aquele batismo que não repetimos? Não aceitando nosso batismo, eles negam que somos seus irmãos. Nós, porém, não repetindo o deles, mas reconhecendo-o como nosso, dizemos: Sois nossos irmãos.
Se eles disserem: “Por que nos procurais? Que quereis de nós?” respondamos: Sois nossos irmãos. Mesmo que nos digam: “Podeis ir embora, nada temos convosco!” Pelo contrário, nós temos muito convosco! Nós confessamos um mesmo Cristo, e assim devemos estar em um só Corpo, sob uma só Cabeça.
Portanto, nós vos suplicamos, irmãos, por aquelas mesmas entranhas da caridade, cujo leite nos alimenta, cujo pão nos fortalece, isto é,por Cristo, nosso Senhor. Com efeito, é agora a ocasião de termos para com eles grande caridade, muita misericórdia, rogando a Deus por eles, a fim de que lhes conceda sobriedade de pensamento para caírem em si e enxergarem, porque nada absolutamente têm a dizer contra a verdade. De fato, apenas lhes resta a fraqueza da animosidade, tanto mais enferma quanto mais julga possuir maior força. Assim, pela mansidão de Cristo, nós vos conjuramos suplicando em favor dos fracos, dos sábios segundo a carne, dos puramente humanos e carnais, mas ainda nossos irmãos, que freqüentam os mesmos sacramentos, embora não conosco, mas os mesmos. Eles respondem um só Amém, embora não conosco, mas o mesmo. Portanto, derramai diante de Deus por eles o âmago de vossa caridade.
-- Dos Comentários sobre os Salmos, de Santo Agostinho, bispo (século V)
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