Amados jovens e queridos amigos em Cristo:
Hoje a Igreja se encontra, com Maria, nos umbrais da casa de Zacarias, em Ain-Karim. Com a nova vida que levava dentro de si, a Virgem de Nazaré se apressou a ir ali, imediatamente depois do fiat da Anunciação, para ajudar sua prima Isabel. Foi Isabel a primeira a reconhecer as maravilhas que Deus estava realizando em Maria. Cheia do Espírito Santo, Isabel se surpreendeu que a mãe do Senhor houvesse ido a sua casa (Lc 1,43). Com intuição profunda do mistério, declarou: Bem-aventurada és tu que creste, pois se hão de cumprir as coisas que da parte do Senhor te foram prometidas (Lc 1,45). Com sua alma cheia de humilde gratidão por Deus, Maria respondeu com um hino de louvor: Porque o Senhor fez em mim maravilhas, santo é o Senhor (Lc 1,49).
Nesta solenidade a Igreja celebra a culminação das maravilhas que Deus realizou em Maria: sua Assunção gloriosa ao céu. E no mesmo hino de ação de graçcas, o Magnificat ressoa em toda a Igreja, como a primeira vez em Ain-Karim: todas as gerações te chamarão bem-aventuradas (Lc 1,48). Nos achamos reunidos aqui, ao pé das Montanhas Rochosas, que nos recordam que Jerusalém também estava rodeada por montes (Sl 124,2) e que Maria subiu até eles (Lc 1,39), para celebrar a subida de Maria a Jeusalem celestial, aos umbrais do templo eterno da Santíssima Trindade. Aqui em Denver, na Jornada Mundial da Juventude, os filhos e filhas católicos dos Estados Unidos, junto com outros de toda raça, língua, povo e nação (Ap 5,9), se unem todas as gerações que desde então tem proclamado: o Poderoso fez maravilhas em teu favor, Maria; e em nosso favor, membros de seu povo peregrino.
Com meu coração cheio de louvor à Rainha dos Céus, sinal de esperança e fonte do consolo em nossa peregrinação de fé até a Jerusalém celestial (Hb 12,22), saúdo a todos que participam desta liturgia solene. Fico feliz em ver tantos sacerdotes, religiosos e fiéis laicos em Denver, do estado do Colorado, de todas as partes do Estados Unidos, e de muitos países do mundo, unidos aos jovens da Jornada Mundial da Juventude para honrar a vitória definitiva da graça em Maria, Mãe do Redentor.
A oitava Jornada Mundial da Juventude é uma celebração da vida. Este encontro nos tem permitido uma séria reflexão sobre as palavras de Jesus Cristo: Eu vim para que tenham vida, e vida em abundância (Jo 10,10). Jovens de todos os rincões do mundo, com oração ardente, tens aberto vosso coração a verdade da promessa de vida nova em Cristo. Mediante os sacramentos, especialmente a penitência e Eucaristia, e a unidade e amizade nascida entre muitos de vós, tens tido uma experiência real e transformadora da vida nova que somente Cristo vos pode dar. Vós, jovens peregrinos, também tens mostrado que compreendeis que o dom da vida de Cristo não é unicamente para vós. Haveis chegado a ser mais conscientes da vossa vocação e missão na Igreja e no mundo. Para mim, nosso encontro tem sido uma profunda e comovedora experiênncia de vossa fé em Cristo, e faço minhas as palavras de São Paulo: Tenho grande confiança em vós. Grande é o motivo de me gloriar de vós. Estou cheio de consolação, transbordo de gozo em todas as nossas tribulações (2Cor 7,4).
Essas não são palavras vazias de elogio. Confio que tenhas compreendido o alcance do desafio que se coloca e tereis a sabedoria e valentia de enfrentá-lo. Há muito que depende de vós.
Este mundo maravilhoso, tão amado pelo Pai que enviou seu Filho único para sua salvação (Jo 3,17), é o teatro de uma batalha interminável que está ocorrendo por nossa dignidade e identidade como seres livres e espirituais. Esta luta tem seu paralelo no combate apocalíptico descrito na primeira leitura da missa. A morte luta contra a vida: uma cultura da morte tenta se impor ao nosso desejo de viver e viver plenamente. Aqueles que se opõe à luz da vida preferem as obras infrutuosas das trevas (Ef 5,11). Preparam injustiças, discriminações, explorações e violência. Em todas as épocas seu êxito aparente se pode medir pela matança de inocentes. Em nosso século, mais que em qualquer época da história, a cultura da morte adquiriu uma forma social e institucionalizada de legalidade para justificar os mais terríveis crimes contra a humanidade: o genocídio, as soluções finais, as limpezas étnicas e o massivo "tirar a vida de seres humanos ainda antes do seu nascimento ou antes que cheguem ao seu destino natural de morrer" (Dominum et vivificantem, 57). A leitura de hoje, tomada do livro do Apocalipse, apresenta a Mulher rodeada por forças hostis. a natureza absoluta de seu ataque está simbolizada no objeto de sua intenção malvada: o Filho, o símbolo da nova vida. O dragão (Ap 12, 3), o princípe deste mundo (Jo 12, 31) e o pai da mentira (Jo 8, 44) tenta incessantemente arrancar do coração humano o sentido de gratidão e respeito ao dom original, extraordinário e fundamental de Deus: a própria vida humana. Hoje está batalha tem sido cada vez direta.
Queridos amigos, este encontro em Denver sobre o tema da vida deveria conduzirmos a uma consciência mais profunda da contradição interna que existe em uma parte da cultura da metrópole moderna.
Quando os pais fundadores desta grande nação incluíram certos direitos inalienáveis na Constituição, algo similar existe em muitos países e muitas declarações internacionais, assim fizeram porque reconheciam a existência de uma lei, uma série de direitos e deveres, esculpidas pelo Criador no coração e consciência de cada pessoa.
Em grande parte do pensamento contemporâneo não se faz nenhuma referência a esta lei garantida pelo Criador. Deixa-se a cargo de cada pessoa a possibilidade de escolher este ou aquele objetivo como conveniente ou útil em determinado conjunto de circunstâncias. E já não existe nada que se considere intrinsicamente bom e universalmente vinculante. Se asseguram direitos, porém, ao não ter nenhuma referência a uma verdade objetiva, carecem de uma base sólida. Existe uma grande confusão em amplos setores da sociedade sobre o que está correto e errado, e estão à merce daqueles que tem poder de criar opinião e impô-las aos demais.
A família se acha especialmente atacada. E se nega o caráter sagrado da vida humana. Naturalmente, os membros mais débeis da sociedade são os que correm o maior risco: recém-nascidos, crianças, enfermos, desválidos, anciões, pobres e desocupados, imigrantes, refugiados e pequenos do mundo.
Jovens peregrinos, Cristo vos necessita para iluminar o mundo e mostrar-lhes a luz da vida (Sl 16, 11). O desafio consiste em fazer que o "sim" da Igreja à vida seja concreto e efetivo. A batalha será grande e necessita de cada um de vós. Ponham sua inteligência, vossos talentos, entusiamo, compaixão e fortaleza ao serviço da vida.
Não tenhais medo. O resultado da batalha pela vida já está decidido, ainda que prossiga a luta em circunstâncias adversas e com muitos sofrimentos. Essa certeza nos oferece a segunda leitura: Mas não! Cristo ressuscitou dentre os mortos, como primícias dos que morreram! Com efeito, se por um homem veio a morte, por um homem vem a ressurreição dos mortos. Assim como em Adão todos morrem, assim em Cristo todos reviverão (1 Cor 15, 20-22). Este é o paradoxo da mensagem cristã: Cristo, a cabeça, já venceu o pecado e a morte. Cristo em seu Corpo, o povo peregrino de Deus, segue sofrendo o ataque do maligno e de todo mal que é capaz a humanidade pecadora.
Nesta etapa da história, a mensagem libertadora do evangelho da vida foi posta em vossas mãos. A missão de proclamá-lo até os confins da terra passa agora a vossa geração. Como o grande apóstolo Paulo, também deveis sentir toda urgência desta tarefa. Ai de mim se não anunciar o evangelho (1Co 9,16). Ai de vós se não defender a vida! A Igreja necessita de vossas energias, vossos entusiasmo e ideais juvenis para fazer que o evangelho da vida penetre na sociedade, transformando o coração das pessoas e as estruturas da sociedade, para crer numa civilização de justiça e amor verdadeiros. Hoje, em um mundo que carece desta luz e de nobres ideais, as pessoas necessitam mais que nunca da espiritualidade sempre nova e vital do Evangelho.
Não tenhas medo de sair às ruas e lugares públicos, como os primeiros apóstolos que anunciavam a Cristo e a boa nova da salvação nas praças da cidade, nas cidades e vilarejos. Não é mais tempo de envergonhar-se do Evangelho (Rm 1, 16). É tempo de anunciá-lo desde os telhados (Mt 10, 27). Não tenhais medo de romper com os estilos de vida conformtáveis e rotineiros, para aceitar a missão de dar a conhecer a Cristo na metrópole moderna. Deveis ir aos cruzamentos dos caminhos (Mt 22, 9) e convidar a todos que encontreis ao banquete que Deus tem preparado ao seu povo. Não devem esconder o Evangelho por medo e indiferença. Não foi pensado para estar escondido, é necessário colocá-lo sob a luz, para que todos possam vê-lo e honram nosso Pai celestial (Mt 5,15-16). Jesus veio buscar os homens e mulheres de seu tempo, comprometendo-os com um diálogo aberto e sincero, independente de suas condições. Como bom samaritano da família humana, aproximou-se das pessoas para curar-las de seus pecados e das feridas que a vida inflige, levá-las para a casa do Pai. Jovens da Jornada Mundial da Juventude, a Igreja pede que vão, com a força do Espírito Santo, aos que estão próximos e longes. Compartilhem com eles a liberdade que haveis achado em Cristo. As pessoas tem sede da autêntica liberdade interior, desejam a vida que Cristo vem dar em abundância. Agora que se avizinha um novo milênio, para o qual toda Igreja está se preparando, o mundo é como um campo já pronto para a colheita. Cristo necessita de ajudantes dispostos a trabalhar em sua vinha. Vós, jovens católicos do mundo, não se acovardem. Em vossas mãos levem a cruz de Cristo. Em vossos lábios, palavras de vida. Em vosso coração, a graça salvífica de Senhor.
No momento de sua Assunção, Maria foi levada a vida, em corpo e alma. Já está em posse das primícias (1Co 15,20) da morte e ressurreição redentora de nosso Salvador. O Filho recebeu dela a vida humana; em troca, deu-Lhe a plenitude da comunhão na vida eterna. Ela é o único ser, além de Cristo, em que o mistério realizou-se plenamente. Em Maria, a vitória final da vida sobre a morte já é uma realidade. E como ensina o Concílio Vaticano II, a Igreja tem alcançado, na Santíssima Virgem, a perfeição, em virtude da qual não tem manchas nem marcas (Lumen gentium, 65). Na Igreja e por ela, também nós esperamos uma herança incorruptível, que não se perde, reservada para nós nos céus (1Pe 1, 4).
Bendita seja, Maria, Mãe do Filho eterno, nascido de teu seio virginal, eras plena de graças (Lc 1, 28). Recebeste mais abundância de vida (Jo 10,10) que os demais descendentes de Adão e Eva. Como a mais fiel dos que ouvem a palavra (Lc 11,28), não apenas conservaste e meditaste este mistério em teu coração (Lc 2, 19.51), mas também conservaste teu corpo e o alimentaste com o amor abnegado com que rodeaste Jesus durante toda sua vida terrena. Como Mãe da Igreja, guia-nos desde o teu lugar no céu e intercedes por n'so. Conduze-nos a Cristo, o caminho, a verdade e a vida (Jo 14,6) e ajuda-nos a crescer em santidade, vencendo o pecado (cf. Lumen gentium, 65).
A liturgia te apresenta, Maria, como a mulher vestida de sol (Ap 12,1). Porém estás vestida, ainda mais esplendidamente, da luz divina, que pode chegar a ser a vida de todos quantos foram criados a imagem e semelhança de Deus mesmo: Nele havia a vida, e a vida era a luz dos homens. A luz resplandece nas trevas, e as trevas não a compreenderam (Jo 1, 4-5). Oh, mulher vestida de sol, os jovens do mundo te saúdam com muito amor, veem a ti com toda valentia de seus corações jovens! Este encontro em Denver os tem ajudado a ser mais conscientes da vida que trouxe teu Filho divino. Todos somos testemunhas. Estes jovens sabem agora que a vida é mais poderosa que as forças da morte e que o amos é mais forte que a morte (Ct 8,6). Teu espírito se alegra, oh Maria, e nosso espírito se alegra contigo, porque o Poderoso fez maravilhas em teu e nosso favor, em favor de todos os jovens congregados aqui em Denver, em favor dos jovens do mundo. O Poderoso fez maravilhas em teu favor, Maria; em nosso favor, contigo. O Poderoso fez maravilhas em nosso favor e santo é seu nome. Sua misericórdia alcança de geração em geração. Nos alegramos, Maria; nos alegramos contigo. Virgem elevada aos céus. O Senhor fez maravilhas em teu favor, o Senhor fez maravilhas em nosso favor. Aleluia, Amém.
-- Homília do Papa João Paulo II, no dia da Festa da Assunção de Maria, durante a Jornada Mundial da Juventude, em Denver (EUA), 15 de Agosto de 1993.
* tradução particular a partir do original em espanhol
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