9 de mar. de 2011

Confissões, de São Patrício - parte IV

Deste modo, devo incessantemente dar graças a Deus, que frequentemente perdoou minha insensatez e negligência, em mais de uma ocasião para não se irar violentamente comigo, que fui colocado como ministro, e não concordei prontamente com o que foi revelado a mim, segundo o que o Espírito me sugeria, e o Senhor misericordioso foi em milhares de vezes, porque viu que eu estava preparado, mas que eu não sabia o que fazer nessas circunstâncias, só poderia fazer algo relativo ao meu gênero de vida, porque muitos tentavam impedir a minha missão, eles estavam falando entre si nas minhas costas dizendo: Porque razão este homem se atira ao perigo no meio de estrangeiros que não conhecem a Deus? Não por malícia, porque eles não sabiam isso, mas eu mesmo posso testificar que eles perceberam a minha rusticidade, e eu não estava pronto para reconhecer a graça que então estava em mim; agora eu sei que deveria tê-lo feito bem antes.

Agora, pois tenho simplesmente colocado para meus irmãos e companheiros de serviço, que acreditaram em mim por causa do que proferi e ainda profiro para fortificar e reforçar vossa fé. Queira Deus que façam maiores e melhores obras! Isto será minha glória, porque o filho sábio é a glória do pai.

Vós sabeis, assim como Deus, como me empenhei no meio de vós desde a minha juventude na fé, na verdade e na sinceridade de coração. Assim para os povos entre os quais vivo eu mostrei e ainda mostro a fé. Deus sabe que não defraudei a nenhum deles, nem considero isso, pelo próprio Deus e sua Igreja, para que não despertasse perseguição contra eles e contra nós todos e para que o nome do Senhor não seja blasfemado por minha causa. Porque está escrito: Ai do homem pelo qual o nome do Senhor for blasfemado.

Pois embora eu seja ignorante em todas as coisas, ainda assim me esforcei para guardar alguns e a mim também. Ainda também aos meus irmãos cristãos, as virgens de Cristo e as mulheres religiosas, que para mim davam espontaneamente alguns pequenos presentes e costumavam jogar ao altar e seus adornos. Eu devolvia a elas e se escandalizavam comigo por causa disso e me perguntavam por que eu agia assim; mas eu, na esperança da eternidade, me protegi de todas as coisas, de forma que não pudessem lesar-me no meu
ministério alegando qualquer desonestidade e que nem mesmo esse mínimo detalhe desse qualquer margem para difamação ou depreciação por parte dos incrédulos.

Por acaso quando batizei milhares de pessoas esperava mesmo que fosse a metade de qualquer coisa deles? Se assim foi, digam-me e eu vos restituirei. E quando o Senhor ordenou clérigos em todas as partes por intermédio da minha humilde pessoa e o ministério gratuitamente eu conferi a eles, se pedi em qualquer lugar qualquer recompensa deles, que seja o valor de um par de sapatos, digam-me na minha frente e os restituirei.

Mais eu fiz todos os esforços por vós para que me recebessem e no meio de vós em todo lugar, me empenhei pela vossa causa, em muitos perigos mesmo nas regiões mais remotas onde não havia ninguém e ninguém havia vindo antes para batizar, ordenar clérigos ou confirmar pessoas. Diligentemente e com alegria, pela graça de Deus, para vossa salvação.
De vez em quando, dei presentes aos reis e também dei recompensas aos seus filhos que viajavam comigo, todavia me prenderam com meus companheiros e naquele dia desejaram com muita avidez matar-me, mas minha hora ainda não havia chegado, e tudo que puderam encontrar conosco eles saquearam e me prenderam a ferros; e no décimo quarto dia o Senhor me libertou do poder deles e tudo o que era nosso nos foi devolvido por amor a Deus e por conta dos amigos imprescindíveis que antes fizemos.

Vós sabeis por experiência própria o quanto eu os pagava para que aqueles que julgavam por todas as regiões que eu frequentemente visitava. Penso que verdadeiramente distribui a eles nada menos que o preço de quinze homens, afim de que pudessem desfrutar da minha companhia e eu da vossa sempre, em Deus. Não me arrependo e nem considero o bastante: ainda pago e pagarei ainda mais; poderoso é o Senhor para conceder que logo eu possa gastar o meu próprio ser pelas vossas almas.

-- Das Cartas de São Patrício, (século V)


-- texto retirado do site Patrística Brasil, onde o autor traduziu do latim.

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