25 de mai. de 2011

Carta a Diogneto

Refutação ao politeísmo



Uma vez que tenhas te purificado de todos os prejuízos que dominam tua mente e libertado de teus hábitos mentais que te enganam, fazendo-te como um homem radicalmente novo, podes começar a ser ouvinte desta, que tu mesmo confessas, ser uma doutrina nova. Veja, não apenas com teus olhos, mas também com tua inteligência qual a realidade e a aparência destes que crês serem vossos deuses. Um é pedra como as que pisamos; outro é um pedaço de bronze, não melhor que o bronze utilizado no uso diário; outro é de madeira, que já está apodrecida; outro é de prata e necessita de um guarda para não ser roubado; outro é de ferro e pode enfurrajar; outro é de argila, em nada melhor que a utilizada nos utensílios mais comuns de uma casa. Não são todos feitos de matéria corruptível? Não foi o escultor que lhes criou, ou o ferreiro ou o prateiro? Não são todas coisas surdas, cegas, insensíveis, imóveis? Não apodrecem todas elas? Não podem ser destruidas? Isto é o que vós chamais deuses e a eles vos escravizais e adorais para acabar sendo como eles. Por isso perseguis os cristãos, porque não creêm que estes sejam deuses?

Refutação ao Judaísmo


Porque os cristãos não praticam a mesma religião dos judeus? Os judeus, enquanto se abstem da idolatria e creêm em apenas um Deus de todas as coisas, um Deus soberano, pensam retamente. Porém se equivocam ao querer atribuir-lhe um culto semelhante ao idolátrico de que falamos. Os gregos mostram ser insensatos ao ofertar objetos materiais, insensíveis e surdos; porém os judeus fazem o mesmo, como se Deus tivesse necessidade deles, isto mais parece loucura que verdadeiro culto religioso. Deus fez o o céu e a terra e tudo o que contém (cf. Sl 145, 6) e nos concede tudo que necessitamos, Ele não tem necessidade de absolutamente nada. Ele que proporciona todas as cosias que possamos imaginar dar a Ele.

Não é necessário te informar sobre escrúpulos com respeito a alimentos, sua superstição quanto ao sábado, gloriarem-se da circunsição e simulação de jejuns; tudo isto são coisas ridículas e indignas de consideração.

Como não considerar ímpios aqueles que de todas as coisas criadas por Deus consideram algumas como bem criadas; e rechaçam outras como impuras e supérfluas? Como não é coisa irreligiosa caluniar a Deus, atribuindo-lhe proibição que fazermos o bem durante o sábado? Não te parece irrazoável gloriar-se da mutilação da carne como sinal de eleição, como se assim fossem particularmente amados por Deus? Com isto penso que terás visto suficientemente quanta razão tem os cristãos de afastar-se dos erros e orgulho dos judeus.

Os Cristãos no Mundo

Cristo Bom Pastor
Cripta de Lucina na catacumba de São Calixto.
Os cristãos não se diferenciam dos outros homens nem pela pátria nem pela língua nem por um gênero de vida especial. De fato, não moram em cidades próprias, nem usam linguagem peculiar, e a sua vida nada tem de extraordinário. A sua doutrina não procede da imaginação fantasista de espíritos exaltados, nem se apóia em qualquer teoria simplesmente humana, como tantas outras.

Moram em cidades gregas ou bárbaras, conforme as circunstâncias de cada um; seguem os costumes da terra, quer no modo de vestir, quer nos alimentos que tomam, quer em outros usos; mas o seu modo de viver é admirável e passa aos olhos de todos por um prodígio. Habitam em suas pátrias, mas como de passagem; têm tudo em comum como os outros cidadãos, mas tudo suportam como se não tivessem pátria. Todo país estrangeiro é sua pátria e toda pátria é para eles tera estrangeira. Casam-se como toda gente e criam seus filhos, mas não rejeitam os recém-nascidos. Têm em comum a mesa, não o leito.

São de carne, porém, não vivem segundo a carne. Moram na terra, mas sua cidade é no céu. Obedecem às leis estabelecidas, mas com seu gênero de vida superam as leis. Amam a todos e por todos são perseguidos. Condenam-nos sem os conhecerem; entregues à morte, dão a vida. São pobres, mas enriquecem a muitos; tudo lhes falta e vivem na abundância. São desprezados, mas no meio dos opróbrios enchem-se de glória; são caluniados, mas transparece o testemunho de sua justiça. Amaldiçoam-nos e eles abençoam. Sofrem afrontas e pagam com honras. Praticam o bem e são castigados como malfeitores; ao serem punidos, alegram-se como se lhes dessem a vida. Os judeus fazem-lhes guerra como a estrangeiros e os pagãos os perseguem; mas nenhum daqueles que os odeiam sabe dizer a causa do seu ódio.

Numa palavra: os cristãos são no mundo o que a alma é no corpo. A alma está em todos os membros do corpo; e os cristãos em todas as cidades do mundo. A alma habita no corpo, mas não provém do corpo; os cristãos estão no mundo, mas não são do mundo. A alma invisível é guardada num corpo visível; todos vêem os cristãos, pois habitam no mundo, contudo, sua piedade é invisível. A carne, sem ser provocada, odeia e combate a alma, só porque lhe impede o gozo dos prazeres; o mundo, sem ter razão para isso, odeia os cristãos precisamente porque se opõem a seus prazeres.

A alma ama o corpo e seus membros, mas o corpo odeia a alma; também os cristãos amam os que os odeiam. Na verdade, a alma está encerrada no corpo, mas é ela que contém o corpo; os cristãos encontram-se detidos no mundo como numa prisão, mas são eles que abraçam o mundo. A alma imortal habita numa tenda mortal; os cristãos vivem como peregrinos em moradas corruptíveis, esperando a incorruptibilidade dos céus. A alma aperfeiçoa-se com a mortificação na comida e na bebida; os cristãos, constantemente mortificados, vêem seu número crescer dia a dia. Deus os colocou em posição tão elevada que lhes é impossível desertar.

-- Da Carta a Diogneto, autor desconhecido (século II)


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