30 de jan. de 2011

O Sacramento da Extrema Unção - parte 1

Agora resta apenas falar do último sacramento, a Extrema Unção. Deste podem ser derivadas muitas lições úteis, não apenas para nossa última hora, mas para todo curso da nossa vida, uma vez que neste sacramento são ungidas as partes do corpo nas quais os cinco sentidos residem, e ao ungir cada uma delas é dito: "Que o Senhor perdoe todos os pecados que tiveres cometido pela visão (ou audição, etc...)". Por aí vemos que os cinco sentidos são cinco portas abertas para todo tipo de pecado penetrar em nossa alma. Se pudermos cuidadosamente guardar estas portas, evitaremos uma multidão de pecados, e estaremos vivendo de maneira justa, e também morreremos de maneira justa.

Agora faleremos rapidamente sobre como guardar estas cinco portas. Que os olhos são uma porta contra os pecados da castidade, nosso Salvador nos ensina quando diz: Eu, porém, vos digo: todo aquele que lançar um olhar de cobiça para uma mulher, já adulterou com ela em seu coração. Se teu olho direito é para ti causa de queda, arranca-o e lança-o longe de ti, porque te é preferível perder-se um só dos teus membros, a que o teu corpo todo seja lançado na geena (Mt 5,28-29). Sabemos que um homem velho ao ver Susana nua, foi imediatamente inflamado com maus desejos de luxúria e, em consequencia, teve uma morte miserável. Também sabemos que Davi, um amigo especial para Deus, ao ver Bersabéia tomando banho, caiu em adultério, e daí assassinato e outros inumeráveis pecados.
O Rei Davi olhando a nudez de Bersabéia.

A razão convence-nos desta verdade; a beleza das mulheres compele, de certa maneira, um homem a amar uma mulher; e a beleza de um homem compele a mulher a amá-lo; e este amor não descansa enquanto não se transformar em algo carnal, do qual deriva a concupisciência e o pecado original. Este mal o apóstolo deplora, quando diz: sinto, porém, nos meus membros outra lei, que luta contra a lei do meu espírito e me prende à lei do pecado, que está nos meus membros. Homem infeliz que sou! Quem me livrará deste corpo que me acarreta a morte? (Rm 7,23-24).

Qual o remédio contra tão grave tentação? O remédio é rápido e fácil, com a assistência de Deus, se desejar fazer uso dele. Santo Agostinho menciona-o numa epístola aos monjes: "se teus olhos se fixarem em alguém, fixe-os no nada". Um simples olhar é quase impossível de evitar, mas ele não pode atingir o coração, exceto se ele continuar fixo no objeto. Portanto, se por eventualidade colocarmos os olhos sobre uma, e então movermos o olhar rapidamente, não haverá perigo para nós; pois, como observa Santo Agostinho, não é num instante, mas no contemplar uma mulher, que reside o perigo. Jó diz: Eu havia feito um pacto com meus olhos: não desejaria olhar nunca para uma virgem (Jó 31,1). Ele não diz: "eu fiz um pacto de não olhar uma mulher" mas sim "não desejar olhar; ou seja, eu não olharei muito tempo para uma virgem, por tanto tempo que a luxúria invada meu coração, eu comece a pensar na sua beleza, e gradualmente a desejar falar com ela, e então abraçá-la. Ele então dá a melhor razão que um homem santo pode dar: Que parte me daria Deus lá do alto, que sorte o Todo-poderoso me enviaria dos céus? (Jó 31,2). Como se ele dissesse: Deus é minha herança e felicidade, meu maior bem, que nada mais excelente pode alguém imaginar; mas Deus ama somente a caridade e a justiça. Tem este mesmo propósito as palavras de Nosso Senhor: Se teu olho te leva ao pecado, arranca-o e lança-o longe de ti (Mt 18,9). Ou seja, utiliza-o como se não fosse teu e acostume seu olhos a evitar objetos  que te levem a pecar, como se tu fosse cego. Agora, aqueles que forem desde a juventude cuidadosos a este respeito, não encontrarão dificuldade em evitar outros vícios; mas quem não for atento, terá dificuldade; embora pela graça de Deus, Ele possa transformar nossa vida e evitarmos os maiores perigos.

Talvez alguém pergunte: por que Deus criou homens e mulheres tão belos, se ele não deseja que os olhemos e admiremos? A resposta é simples: Deus criou o homem e mulher para o casamento, como Ele falou desde o princípio: Não é bom que o homem esteja só; vou dar-lhe uma ajuda que lhe seja adequada (Gn 2,18). O homem não requer a ajuda da mulher, exceto para conceber e criar as crianças, como já demonstramos a partir das palavras de Santo Agostinho. Mas um homem e sua esposa não concordariam facilmente, nem estariam dispostos a viver juntos, se não houver uma certa beleza a atrair e iniciar o amor. A mulher foi feita bela para amar seu marido, ela não pode ser amada de forma carnal por outros; como diz a lei: não cobiçarás a mulher do teu próximo (Ex 20,18); e aos maridos, o apóstolo fala: Maridos, amai as vossas mulheres (Ef 5,25).

Há muitas coisas boas e bonitas que podem ser desejadas, mas não por todas as pessoas. Carne e vinho são boas para a saude, mas nem sempre são adequadas para os doentes. Da mesma maneira, após a ressurreição, a beleza de um homem e uma mulher podem ser admiradas por nós, desde que não tenhamos pensamentos concupiscientes. Ninguém ficaria surpreso de ser permitido admirar a beleza do Sol, Lua, estrelas e flores, desde que não tenha pensamentos indevidos. Da mesma forma, não é permitido ter prazer olhando homens e mulheres bonitas, por que a visão pode aumentar ou nutrir pensamentos carnais indevidos.


-- Do Livro A Arte de Morrer Bem, de São Roberto Belarmino, bispo (século XVIII)

-- Nota: sempre que possível procuro utilizar textos traduzidos por profissionais e publicados com autorização de nossas autoridades eclesiais. Este, no entanto, foi traduzido por mim, a partir do livro em Inglês, por não tê-lo encontrado traduzido para o Português. O texto em inglês está disponível aqui.

-- como o capítulo é bastante longo, e a tradução demanda tempo, estou publicando a primeira parte enquanto trabalho no restante do texto.

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