7 de mar. de 2013

Homília sobre o Jejum em Tempo de Quaresma

Irmãos, o tempo de Quaresma, quando comparado ao restante do ano, é como um porto protegido, no qual todos navegadores podem se aproveitar de calmas águas espirituais. A Quaresma é um tempo de salvação não apenas para monges e padres, mas para todos, governantes ou governados, ricos ou pobres, imperadores e escravos, para todas as raças e idades.

Nas cidades e vilas deve-se reduzir as festividades e algazarias, para que salmos, preces e meditações tomem seu lugar, pois é para isto que o Senhor Deus nos propicia estas semanas e guia nossos espíritos para a paz e perdão das ofensas, se, com coração sincero, nos prostarmos perante Ele com temor, prometendo melhorarmos no futuro.

Os líderes da Igreja devem falar de modo simples, para que todos entendam, pois assim como os atletas precisam de incentivo nos estádios, aqueles que jejuam precisam de encorajamento dos seus pastores.

Assim, como fui posto a frente deste rebanho, devo dirigir-lhes algumas breves palavras. Jejuar é uma renovação da alma, como dizem os apóstolos, mesmo que estejamos fracos fisicamente, o espírito está se fortalecendo dia a dia. E renovado, o espírito torna-se mais bontio, mais próximo de sua beleza original; amorosamente desenhado  por aquele que disse Eu e o Pai viremos e faremos morada neste lugar.

Se tal é a graça do jejum, de nos tornarmos lugares adequados para Deus, devemos apreciá-lo, felizes, sem reclamar da escassez da dieta, pois sabemos que o Senhor preparou um banquete para milhares apenas com poucos pães. Também porque o não habitual e difícil, com entusiasmo, torna-se agradável.

O jejum não é definido apenas pela comida, mas também pela abstinênca de todo mal, como nos explicaram os santos padres. Portanto, eu lhes imploro, vamos nos abster da preguiça, avareza, malicias, roubos, desânimo, lerdeza, auto-indulgência e da excessiva confiança em si mesmo; vamos nos abster de desejos destrutivos que a serpente coloca a nossa frente quando estamos jejuando.

Ouçamos aquele que disse: "o fruto que colocaste na minha frente era agradável de segurar e de ótimo para comer".  Atentos, pois está dito: "agradável de segurar" não "agradável por natureza". Pois, assim como se alguém morder uma linda fruta pode estar podre por dentro, o prazer pode parecer de uma doçura incalculável, mas quando experimentado é mais amargo que o fel, ou melhor, é como uma espada de dois gumes que devora a alma que conquistou.

Isto é o que sofreu Adão quando foi enganado pela serpente, pois quando experimentou o fruto proibido encontrou morte, não vida.  Isto também é o que todos sofrem até hoje, pois somos enganados pelo demônio. Pois Lucífer, que é escuridão, tem poder para assumir a aparência de um anjo de luz, pode também transformar a aparência do que é ruim em agradável, o amargo em doce, trevas em luz, feiura em beleza, morte em vida, pois não cessa de guiar o mundo para a perdição em cada oportunidade.

Mas que nós, caro rebanho, não sejamos conduzidos à mentira, nem soframos o destino dos pássaros  que procurando por comida caem na armadilha dos caçadores. Ao contrário, assim que percebermos os disfarces do mal, virmos a nudez do demônio, possamos nos afastar dele em definitivo.

Aceitemos felizes os tempos de salmodiar, sejamos entusiásticos com os hinos, atentos às leituras, nos prostemos e oremos conforme o recomendado para cada hora; trabalhemos honestamente, pois o trabalho é bom e também por que aquele que não trabalha não é merecedor do alimento. Compartilhemos os problemas de todos, pois se um é fraco, outro é forte; nos alimentemos e bebamos com moderação, para que não provoquemos inveja entre os malvados, mas zelemos com bondade. Em tudo tenhamos compaixão para com os outros, sejamos razoáveis, obedientes e cheios de perdão e bons frutos; que a Paz de Cristo mantenha-se em nossos corações e pensamentos, guiando nossas ações.

E que cada um seja considerado pelo Pai como justo, sem condenação, quando alcançar o dia supremo da ressurreição, que no seu tempo ganhe o reino dos céus com Jesus Cristo Nosso Senhor, a quem se deve toda glória, com o Pai e o Espírito Santo, agora e para todo sempre, pelos tempos dos tempos. Amém.

-- São Teodoro Estudita, monge, século IX
* tradução própria

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