14 de mar. de 2013

Homília de Páscoa, 2012 - Cardeal Bergoglio


Na madrugada saíram em direção ao sepulcro. Antes haviam comprado perfumes para ungir o corpo de Jesus. Preparando tudo, praticamente haviam passado a noite em vigília, esperando que houvesse luz suficiente para irem tão logo tivesse saído o Sol. Nós também estamos nesta noite vigilantes, preparando-nos para ungir o corpo do Senhor enquanto recordamos as maravilhas de Deus na história da humanidade. Principalmente recordemos que Jesus naquela mesma noite também passou orando: "Foi uma noite de vigília para o Senhor, a fim de tirá-los do Egito" (Ex 12, 42a). Esta vigília é uma resposta a um mandado de gratidão: "essa mesma noite é uma vigília a ser celebrada de geração em geração por todos os israelitas, em honra do Senhor" (Ex 12, 42b). 

Assim como as crianças israelitas fazem, é possível que nossos filhos ou amigos perguntem porque passamos a noite em vigília. A resposta surge do mais profundo da nossa memória de povo eleito pelo Senhor: "é que o Senhor nos tirou do Egito com sua mão poderosa, da casa da servidão" (Ex 13,14). Assim é: "esta é a noite em que o Senhor nos tirou do Egito, nossos pais, a nós filhos de Israel, e nos fez passar a pé enxuto o Mar Vermelho", "esta é a noite em que dissipou as trevas dos pecados com o resplendor da coluna de fogo" (cf Ex 13,21).; "a noite em que nós, pecadores, fomos restituídos à graça de Deus", "a noite em que Cristo rompeu as ataduras da morte e surgiu vitorioso dos abismos". Esta é a noite em que se consolida a liberdade. Por isto, esta noite é clara como o dia. 

Com a luz que celebramos esta vigília seguirá adiante nossa vida e o que aconteceu aos nossos pais no deserto, também ocorrerá conosco. Muitas vezes as dificuldades, as distrações do caminho, as dores e problemas obscurecem nossa alegria e, inclusive, a certeza desta liberdade; e podemos, até mesmo, chegar a  suspirarmos pelas "coisas lindas" que tínhamos na escravidão, os alhos e cebolas do Egito (cf Num 11,4-6); inclusive pode nos dominar a impaciência e optarmos pelo imediatismo dos ídolos (cf. Ex 32,1-6). Nestes momentos parece que o Sol se esconde, retorna a noite e a liberdade entra em eclipse. 

Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, e Salomé, com o dia já amanhecido, lhes caiu outra noite, a noite do medo e saíram correndo do sepulcro (cf Mc 16,8). Saíram correndo sem dizer nada a ninguém. O medo as fez esquecer o que haviam escutado a pouco: "Buscais Jesus de Nazaré, que foi crucificado. Ele ressuscitou, já não está aqui". (Mc 16, 6). O medo as emudeceu, não podiam proclamar a boa notícia. O medo paralisou o coração e preferiram um fracasso seguro à esperança, essa que lhes dizia: "Vão a Galiléia, ali O verão" (cf. Mc 16,7). Assim também acontece conosco, como elas temos medo da esperança e preferimos nos resguardar em nossos limites, mesquinharias e pecados, nas dúvidas e negações que, bem ou mal, podemos manejar. Ela vinham tristes, vinham para ungir um cadáver.. e lhes ocorre isto; e assim como os discípulos de Emaús se fecham na desilusão (cf. Lc 24,13-24). No fundotinham medo da alegria.

A história se repete. Nas nossas noites, noites de medo, noites de tentação e provas, noites em que preferimos a escravidão vencida, o Senhor segue vigiando como fez naquela noite no Egito; com palavras doces e paternais nos diz: "Vede minhas mãos e meus pés, sou eu mesmo; apalpai e vede: um espírito não tem carne nem ossos, como vedes que tenho."(Lc 24,39). Ou, as vezes, com um pouco mais de energia: "Ó gente sem inteligência! Como sois tardos de coração para crerdes em tudo o que anunciaram os profetas! Porventura não era necessário que Cristo sofresse essas coisas e assim entrasse na sua glória?" (Lc 24,25-26).

Cada vez que Deus se manifestava a um israelita procurava dissipar-lhe o medo: "Não temeis", lhes dizia. O mesmo faz Jesus: "não tenham medo",. É o que anjo dizia às três mulheres cujo medo impelia a optar pelo velório. Nesta noite de vigília digamos uns aos outros: "não tenhas medo",  não nos esquivemos da certeza de Deus, não rechacemos a esperança. Não optemos pela segurança do sepulcro, do vazio e da imundície cheia de pecados e egoísmo. Abramo-nos ao dom da esperança. Não temamos a alegria da Ressureição de Cristo.

Esta noite também Maria estava velando. Suas entranhas lhe faziam intuir a proximidade do fim desta vida que concebera em Nazaré e sua fé confirmava a intuição. A Maria pedimos que, como primeira discípula, nos ensine a perserverar em vigília, nos acompanhe na paciência, nos fortaleça na esperança, pedimos que nos leve ao encontro de seu Filho Ressucitado; pedimos que nos livre do medo, de tal maneira que possamos escutar o anúncio do anjo e também sair correndo...  não de susto, mas sim para anunciar a outras pessoas, pois Buenos Aires necessita muito. 

* tradução própria

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